Texto de :Ricardo Gondim
Desisto da felicidade que me ensinaram. Procurei por esta dama virtuosa feito um caçador de borboletas. Armado de rede e binóculos, percorri florestas e cavernas buscando prender a libélula da satisfação plena. Acabei frustrado: quanto mais eu persegui a tal felicidade, mais ela voou para longe de mim.
Rejeito o gozo esfuziante dos folhetins. Agora vou perseguir um outro tipo de existência. Pergunto aonde foi parar o mundo que eu experimentei em minha infância. Nós andávamos pela cidade sem o pavor da morte. Os meninos achavam mangueiras para jogar pedras e lagoas para nadar. Acabei inconformado com a crueldade tecnológica que desmanchou a brincadeira de pular corda, de amarelinha. O universo dos aparelhos, das conexões, dos jogos eletrônicos parece menos infantil.
Não quero uma felicidade que evita o abraço esquálido dos que foram condenados à miséria ou o sorriso dos idosos que se arrastam pelas calçadas esburacadas da cidade. Prometo que não vou blindar as portas do meu coração para a dor de mães que choram pelos filhos drogados. Não permitirei que os fossos do preconceito e do desdém me isolem numa masmorra que confunde paz com indiferença.
Abro mão de perseguir a amizade de gente famosa. Por tanto tempo fui estúpido, acreditando que a companhia deles me faria importante e feliz. Vou procurar novos amigos. Pretendo andar ao lado de gente simples, e aprender a grandeza dos humildes. Minha intuição me avisa que uma conversa despretensiosa vale mais que mil encontros sofisticados.
Abro mão dos projetos magníficos. Só agora acordei para a tolice de conquistar metas irrealizáveis. Imaginei que sucesso nos objetivos mais fantásticos seria fonte de alegria, mas eu só me arranhei. Almejo aprender a viver cada vão momento como sagrado, transformando o almoço em liturgia, celebrando os encontros como solenidade e cantando as minhas músicas prediletas como hinos de gratidão à vida.
Cansei de defender honra, reputação e posicionamentos. Abdico de estar certo. De agora em diante, confesso abertamente as minhas incertezas. Recuso-me rolar insone na cama porque alguns, que sequer conheço, me têm em baixa conta. Não vou retrucar quando me sentir atingido. Ando, crescentemente, disposto a aprender o significado da afirmação: quem quiser ganhar sua vida a perderá e quem perder sua vida a ganhará.
Não pretendo segurar o amor de ninguém. Anseio por relacionamentos livres, leves e soltos, deixando que meus amigos acertem ou não o caminho deles. Que cada um conviva com as suas escolhas e construa o seu caminho no caminhar. Arrisco conviver na gratuidade dos afetos, sem cobrança. Preciso acreditar que ninguém deve nada a ninguém senão respeito à liberdade e à dignidade. Aventuro-me fazer o bem e não cobrar nada em troca.
Já que desisto de um jeito de ser feliz, resta-me seguir pela vereda incerta da minha verdade. É melhor deitar a cabeça, sabendo que sou honesto comigo mesmo, do que aceitar os jogos de poder que me asfixiaram por anos. Não quero fórmulas fáceis, nem aceito “cinco passos para uma vida tranquila”. Essas receitas roubaram o meu bem mais precioso: tempo. Sei que o porvir não se converterá em um idílio no estalar dos dedos. Contento-me em notar que pequenas alegrias e poucos sorrisos pontuarão a minha existência. Não anelo por muito mais. Essas pitadas serão suficientes para eu dizer no fim de tudo: viver valeu.
Soli Deo Gloria